Governo Trump acusa Brasil de censura e retrocesso nos direitos humanos, visando Lula e Moraes
O Departamento de Estado dos EUA critica as ações de Alexandre de Moraes, cita o presidente brasileiro e intensifica a pressão sobre Brasília.

Já era evidente que um novo período nas relações diplomáticas entre Brasília e Washington estava em curso antes deste dia. Contudo, após intensos desentendimentos no âmbito econômico e político, na quarta-feira (12), a Casa Branca elevou o confronto ao campo dos direitos humanos, denunciando o que considerou censura e violência no Estado brasileiro, com ênfase na atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) e na figura de Alexandre de Moraes.
A situação dos direitos humanos no Brasil se deteriorou ao longo do ano. Os tribunais adotaram medidas amplas e desproporcionais para restringir a liberdade de expressão e a liberdade na internet, bloqueando o acesso de milhões de usuários a informações em uma plataforma de mídia social relevante, em resposta a um processo judicial.
Desta vez, a ação surgiu de um documento oficial do Departamento de Estado dos EUA, órgão equivalente ao Itamaraty no Brasil, e não de um comunicado do presidente Donald Trump ou de um decreto assinado por ele.
O relatório compõe uma linha de documentos publicados anualmente que analisam os 196 países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) e é reconhecido como referência global, sendo utilizado, inclusive, em tribunais dos Estados Unidos e internacionais.
A publicação de hoje, de 2024, previa um lançamento entre março e abril, porém foi remarcado pelo governo Trump.
Ademais das denúncias sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, o relatório também critica outros países e aponta que, na Europa, existem “abusos significativos de direitos humanos”.
Em El Salvador, onde o governo Trump enviou diversos imigrantes deportados e onde governa um aliado do republicano, Nayib Bukele, foi recentemente aprovada a reeleição ilimitada no país.
Lula, Moraes e os direitos humanos, segundo a Casa Branca.
O relatório menciona diretamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro do STF Alexandre de Moraes, entre as denúncias que abordam falhas de segurança, direitos trabalhistas, liberdade de imprensa e violência praticada pelo Estado.
Em relação a Moraes, as críticas se concentram em seu envolvimento na suposta censura de perfis nas redes sociais. O documento detalha ordens dadas diretamente pelo ministro para suspender mais de 100 contas de usuários na plataforma X (anteriormente Twitter).
A decisão, segundo o relatório, acabou reprimindo desproporcionalmente a manifestação de defensores do ex-presidente Bolsonaro, em vez de implementar medidas mais restritivas para punir conteúdos que incitavam ações ilegais iminentes ou assédio.
Lula é citado em um tópico dedicado ao antissemitismo, no qual se observa o crescimento de ataques contra a população judaica no Brasil após os ataques terroristas do Hamas no território israelense em outubro de 2023.
O documento recorda que, em 2024, Lula afirmou que “o que está acontecendo na Faixa de Gaza… é um genocídio”. Em seu pronunciamento, ele relacionou o ocorrido na Palestina à “quando Hitler decidiu matar os judeus”.
Justiça, liberdade e violência.
A atuação do Judiciário brasileiro é destacada em diversos trechos do documento.
A Constituição proíbe prisões e detenções arbitrárias e assegura o direito das pessoas contestarem a legalidade de sua prisão ou detenção no âmbito da justiça. O governo geralmente cumpriu esses requisitos; contudo, figuras políticas e grupos de direitos afirmaram que o governo manteve centenas de pessoas detidas por vários meses sem apresentar acusações, acusadas de participação nos protestos que levaram à invasão de prédios governamentais em 8 de janeiro de 2023, e que esses manifestantes tiveram negado acesso a advogados.
A atuação do STF em relação à liberdade de expressão e de imprensa também recebeu atenção.
O governo também suprimiu discursos politicamente desfavorcidos com base na justificativa de que constituíam “discurso de ódio”, um termo vago e desvinculado do direito internacional dos direitos humanos. Questões significativas de direitos humanos incluíram relatos críveis de: execuções arbitrárias ou ilegais; tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante; prisão ou detenção arbitrária; e graves restrições à liberdade de expressão e à liberdade de imprensa, incluindo violência ou ameaças de violência contra jornalistas.
Quando os assuntos abordam questões não diretamente relacionadas ao governo brasileiro, a atitude também é de cobrança.
Questões significativas de direitos humanos compreenderam relatos preocupantes de: execuções arbitrárias ou ilegais; tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante; prisão ou detenção arbitrária; e restrições graves à liberdade de expressão e à liberdade de imprensa, incluindo violência ou ameaças de violência contra jornalistas.
Uma nova interpretação do Departamento de Estado dos EUA.
O relatório anual de direitos humanos dos Estados Unidos passou por mudanças significativas durante o período de gestão de Trump. O documento, que historicamente serviu como referência internacional para avaliar a situação de liberdades civis e garantias individuais, viu a redução drástica de trechos críticos a aliados estratégicos do governo republicano.
No caso de El Salvador, por exemplo, a nova versão afirma que não há “relatos verificáveis de abusos significativos de direitos humanos”, uma mudança radical em relação ao texto de 2023, que listava execuções ilegais, tortura e condições carcerárias severas.
A parte referente a Israel também foi reduzida, omitindo a crise humanitária e o número de mortos em Gaza, que se estima em aproximadamente 61 mil pelo Ministério da Saúde local.
O relatório também aumentou as críticas a países com os quais Washington tem divergido em várias questões. Para países como Brasil e África do Sul, a linguagem se tornou mais contundente, enfatizando a deterioração de direitos e problemas institucionais.
Na África do Sul, o documento menciona um ritmo preocupante de expropriação de terras e abusos contra minorias raciais, em consonância com a narrativa utilizada por Trump para justificar uma ordem executiva que previa o reassentamento de afrikaners nos EUA.
A Europa também ganhou destaque, com preocupações sobre a suposta supressão de líderes de direita e restrições à liberdade de expressão em países como Romênia, Alemanha e França.
Funcionários do próprio Departamento de Estado, que preferiram não ser identificados, relataram que o documento sofreu atrasos de meses para ser reformulado em consonância com a agenda America First.
Novas categorias como “Vida”, “Liberdade” e “Segurança da Pessoa” foram incorporadas, ao mesmo tempo em que relatos sobre questões como direitos LGBTQI foram, em grande parte, deixados de fora.
Tammy Bruce, que atuava como porta-voz, justificou as modificações alegando que o objetivo foi tornar o conteúdo mais acessível e menos “politicamente tendencioso”, evitando comentar sobre as exclusões específicas.
Analistas, como o ex-funcionário do Departamento de Estado dos EUA, Josh Paul, argumentam que o resultado se assemelha mais a “propaganda” do que a um relatório democrático e imparcial.
As mudanças ocorrem em decorrência da reestruturação do próprio Departamento de Estado, que envolveu a demissão de centenas de funcionários do Bureau de Democracia, Direitos Humanos e Trabalho, setor historicamente responsável pela elaboração do relatório.
A prioridade de figuras influentes do governo, como o secretário de Estado norte-americano Marco Rubio, é agora redirecionar o documento para refletir os chamados “valores ocidentais”.
Com informações da Reuters
Fonte por: Seu Dinheiro